Psicanálise: Arte ou Ciência?

 

“A ciência não é uma ilusão, mas seria uma ilusão acreditar que poderemos encontrar noutro lugar o que ela não nos pode dar”

                                                          Sigmund Freud

 

                    A Psicanálise já teve seus momentos gloriosos, particularmente na segunda metade do séc. XX. Sigmund Freud (1856-1939), médico neurologista, psiquiatra, criou a Psicanálise e, a partir daí, surgiram notáveis seguidores que acabaram “aprimorando” ou mesmo criando outras linhas teóricas e técnicas como, por exemplo, a Psicologia Analítica de Carl Gustav Jung (1875-1961).

                    Muitas críticas surgiram e também foram estabelecidas formas bastante destrutivas de atacar a Psicanálise. Uma das mais contundentes justamente é a da psicóloga, professora da Faculdade Simmons, de Boston, Sophie Freud. A neta de Freud afirma que “Só quem tem pouco bom senso levaria hoje a sério a maioria das ideias de Freud” (Cavalcante, 2016).

                    As críticas geralmente se referem à inexistência de metodologia científica que possa abarcar os conceitos e práticas utilizadas, tais como testes que comprovem realmente a eficácia de determina técnica que, muitas vezes, fica restrita a poucos pacientes e à interpretação do psicanalista e que, portanto, levaria a Psicanálise a estar mais próxima da Arte do que da Ciência. Alguns até chamam vários de seus conceitos e técnicas como “fantasia psicanalítica”.

                    Ao mesmo tempo, diversas drogas seriam capazes de resolver “as angústias da alma” quase que instantaneamente (como o antidepressivo Prozac, que já foi chamado de pílula da felicidade), ao passo que, com a Psicanálise, um tratamento poderia levar bastante tempo até que apresentasse um resultado efetivo.

                    Ao que parece, o imediatismo que tomou conta da sociedade moderna pode levar a crer que drogas resolverão todos os problemas psicológicos das pessoas o que, absolutamente, não é verdade. Elas podem sim, em muitos casos, aliviar os sintomas e trazer um importante bem-estar, principalmente em momentos críticos o que, sabidamente, não nos faltam. Nos dias atuais, particularmente, problemas como depressão, ansiedade e suicídio, acabaram apresentando um crescimento significativo. Somos essencialmente seres sociais; se nos tirarem isso, sucumbiremos...

                     É muito interessante que o próprio Freud previu que “a biologia era um campo de possibilidades ilimitadas que poderia embasar o edifício da teoria psicanalítica” (Lima, 2009). É justamente esse o aspecto que vem se apresentando hoje com a chamada “Neuropsicanálise”, que seria a integração entre a Psicanálise e a Neurofisiologia. Não apenas isso, a neuroanatomia também pode ser de fundamental importância para apoiar as teorias e técnicas da Psicanálise. Como se sabe, por exemplo, a depressão possui um componente genético, ou seja, uma situação potencial que poderá se manifestar dependendo de diversos fatores, como estímulos ambientais, história de vida, etc. Já a esquizofrenia possui origem física, relacionada a um problema na anatomia do córtex pré-frontal do nosso cérebro, sendo que outrora era classificado como um trauma psicológico.

                    Ainda assim, realmente algumas críticas são cabíveis pois, a própria linguagem utilizada pela Psicanálise muitas vezes parece algo feito apenas para “iniciados”, algo hermético, difícil de entender, e talvez por isso mesmo, sujeito a visões distintas. Interpretar sonhos (adivinhação?), complexo de Édipo, a insistência em justificar inúmeros problemas como de origem sexual, o hermetismo de inúmeros psicanalistas, como se não existissem outras possibilidades interpretativas à luz da Ciência, também contribuem para que a Psicanálise às vezes possa parecer mais Arte do que Ciência.

                    Com tudo isso, seria possível imaginar que Freud e seu legado estariam condenados ou reduzidos mais a uma importância literária (aliás, os textos de Freud são de rara elegância mesmo) do que científica. Entretanto, novas e importantíssimas luzes surgem com o auxílio da Neurofisiologia, como já afirmado.

                    O excepcional artigo “O modelo estrutural de Freud e o cérebro: uma proposta de integração entre psicanálise e a neurofisiologia”, de Andréa Pereira de Lima (2009), faz uma compilação dos principais artigos científicos que podem respaldar os conceitos da segunda tópica freudiana, no que se refere ao que Freud chamou “aparelho psíquico”, classificado como id, ego e superego.  

                    Nesse artigo, a autora verificou que, analisando 20 trabalhos (de uma pesquisa inicial de 100) com os conceitos da segunda tópica de Freud, seria possível estabelecer uma forte relação do id, ego e superego, com algumas estruturas encefálicas e seus respectivos funcionamentos.

                    Desta forma, “o id estaria relacionado aos circuitos neurais filogeneticamente mais antigos, como os circuitos do tronco cerebral, o feixe prosencefálico medial, a amígdala medial, o septo pelúcido, o hipotálamo o núcleo acumbens, o estriado e os núcleos talâmicos. O superego, como um freio modulador dos interesses motivacionais/pulsionais do id, estaria representado principalmente pelo núcleo central da amígdala e pelo córtex da ínsula. O ego, como o mediador entre as forças que operam no id, no superego e as exigências da realidade externa, estaria relacionado principalmente ao córtex pré-frontal, considerado atualmente a sede da personalidade, importante para a tomada de decisões e ajuste social do comportamento” (Lima, 2009).

                    Certamente, esses importantes estudos estão sujeitos a novos aprofundamentos e revisões, mas é um passo importantíssimo para trazer a Psicanálise de volta, onde o genial Sigmund Freud deverá ser ratificado como uma das mais importantes e influentes personalidades da história.

                    Sim, Freud não morreu, ao contrário, tal como a fênix, vem ressurgindo com mais força, mais embasamento, novas motivações, nesta tão falada pós-modernidade...

                   

 

Fontes:

Cavalcante, R. (2016). A psicanálise no divã. Recuperado de https://super.abril.com.br/historia/a-psicanalise-no-diva/#:~:text=Apesar%20de%20t%C3%A3o%20popular%2C%20a%20psican%C3%A1lise%20%28nome%20que,passam%20de%20boa%20literatura%20%28ele%20escrevia%20muito%20bem%29.

Lima, A. P. (2009). O modelo estrutural de Freud e o cérebro: uma proposta de integração entre a psicanálise e a neurofisiologia. Recuperado de https://www.scielo.br/pdf/rpc/v37n6/a05v37n6.pdf.

Oliveira, D.R.A. (2020). Psicanálise: muita conversa fiada, nenhuma ciência. Recuperado de

https://www.revistaquestaodeciencia.com.br/dossiequestao/2020/06/25/psicanalise-muita-conversa-fiada-nenhuma-ciencia.

 

Comentários

  1. A psicanálise de Freud sempre será essencial e reconhecida por nós, psicólogos. É claro que hoje em dia existem diversas abordagens mas todas tem Freud como base, eu uso uma abordagem diferente da psicanálise, a TCC mas eu só consigo ajudar meus pacientes pq a Freud criou a psicanálise. É ciência sim, mas também é arte. E que as terapias continuem evoluindo cada vez mais.
    Excelente artigo!

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