ANSIEDADE: Brasil, destaque mundial!

 

Nada é tão lamentável e nocivo como antecipar desgraças.

                                   Sêneca (4 a.C. – 65d.C.)

 

                    Definitivamente, “o Brasil não é para principiantes”, como afirmou o genial compositor brasileiro, Tom Jobim. Entre nossos perturbadores destaques, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), dados de 2015 indicam que o nosso país é campeão mundial em percentual de pessoas com transtorno de ansiedade. São nada menos que 9,3% da população (18,6 milhões de pessoas).

                    O que é Transtorno de Ansiedade? De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DMS-5), de 2014, “Os transtornos de ansiedade incluem transtornos que compartilham características de medo e ansiedade excessivos e perturbações comportamentais relacionados” (p. 189). Esse transtorno também está na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10), código F.41 (transtorno de ansiedade generalizada, mas há outros).

                    Imagine você, há uns 15.000 anos, caminhando cuidadosamente pela savana africana em busca de algum animal para caçar...repentinamente você avista uns arbustos, mas não consegue enxergá-los muito bem (realmente nossa visão não é algo tão extraordinário comparada à de outros animais) ...os arbustos se mexem, seu corpo começa a trabalhar mais intensamente, vem a incerteza, o medo, a ansiedade, você sabe que necessita levar alimento para sua tribo, eles aguardam com muita expectativa...o que poderá ser? Ao se aproximar um pouco mais, você observa que era apenas um grupo de pequenos pássaros que acabam voando para longe, diante da sua aproximação...alívio e frustração tomam conta de seus sentimentos...você continua sua missão. Mais tarde, com êxito ou não desta vez, você retornará à sua tribo, estará muito cansado, mas dormirá muito bem, profundamente...

                    Agora, você está no séc. XXI, os compromissos do dia excederiam 24h, mas é “essencial” cumpri-los todos. O trânsito está terrível, a pressão por resultados no trabalho é enorme e aumentam a cada dia, suas obrigações matrimoniais e paternais são intensas...as mídias sociais (quantos likes hoje?), você se cobra mais e mais...está sentindo uma dor no peito, seu coração acelera, o infarto caminha a passos largos...corre para o pronto-socorro mais próximo...a morte é iminente!

                    Não era nada, seu coração está ótimo, tome o resto do dia para descansar...você vai para casa, tenta conversar sobre o ocorrido, mas o ambiente não está propício, as crianças estão em isolamento social há meses, as aulas on-line seguem regulares, necessitam da sua ajuda, o seu par está encerrado no quarto com o computador improvisadamente colocado sobre a mesinha da cama (você não poderá pensar na palavra criado-mudo, pois é politicamente incorreto para alguns, um momento de transição na busca de igualdade e eliminação de muitos preconceitos que assolam um país fundamentalmente desigual). Você se deita, mas não consegue dormir...

                    Bem-vindo ao grupo dos que estão com algum tipo de transtorno de ansiedade!

                    Esse transtorno, em geral indica um medo e ansiedade exagerados, um certo nível de angústia, de sofrimento em relação ao futuro, uma sensação de estar “fora do corpo”, como se estivesse vivendo em um mundo paralelo, um sonho/pesadelo. Muitas vezes vem acompanhado de depressão. O DSM-5 classifica ainda os transtornos de ansiedade em: transtorno de ansiedade de separação, sofrimento excessivo diante da possibilidade de separação de casa ou de alguém o qual você é apegado; mutismo seletivo, fracasso na fala em interações sociais; fobia específica, medo ou ansiedade acentuados, por exemplo de altura, de tomar injeção (para vacina contra covid não vale...tome a vacina...); transtorno de ansiedade social (fobia social), medo de ser avaliado por outros em uma situação social; transtorno de pânico, ataques de pânico inesperados recorrentes; agorafobia, medo ou ansiedade acentuado ou intenso desencadeado pela exposição real ou prevista a diversas situações (p. ex. usar transporte público, permanecer em uma fila, sair de casa sozinho, entre outros); transtorno de ansiedade generalizada, ansiedade ou preocupação exagerada diante da probabilidade real de algum acontecimento ou antecipação de algo que poderá ocorrer; transtorno de ansiedade induzido por substância/medicamento, consumo ou abstinência de substâncias diversas.

                    Evidentemente, o momento atual pelo qual passa a humanidade é propício ao incremento dos transtornos mentais, e realmente é isso que está ocorrendo. No Brasil, infelizmente, não é diferente; aliás, tem sido até pior do que em outros países, como é o caso da ansiedade. Afirmar categoricamente os porquês dessa situação seria leviandade, mas é possível verificar o quanto nossa sociedade tem sofrido com problemas econômicos e desemprego há vários anos, trazendo inseguridade e penúria psicológica e material para muitos, incerteza diante de um quadro político de muita instabilidade, isolamento social, revisão nas relações amorosas, familiares, laborais, medo do adoecimento, da perda de parentes e amigos, do emprego.

                 E o que fazer diante dessa complexidade pós-moderna? Somente prestidigitadores poderão ter a solução; e isso não falta no nosso Brasil. Entretanto, dentro do possível, é muito importante seguir as velhas e fundamentais recomendações: fazer exercício físico (essencial para o corpo, a mente e o “espírito”), alimentação adequada, relacionamentos construtivos, poder expor seus sentimentos a pessoas em que confie, meditar (meditação não é nenhum modismo e não está necessariamente vinculado a nenhum aspecto religioso ou sectário, embora não haja, per se, nenhum problema nisso), praticar sua espiritualidade (também, não necessariamente precisa estar vinculado a nenhum credo ou instituição religiosa).

                    E se não der resultado? Não se furte a procurar ajuda profissional. Um psiquiatra, psicólogo ou psicanalista poderão realizar um diagnóstico preciso da situação, lembrando-se de que, além de vários tipos de transtorno de ansiedade, há a possibilidade da existência de comorbidades (por exemplo, a depressão). Os sintomas mencionados também poder estar vinculados a outras enfermidades.

                    Por mais óbvio que pareça, cuidar de si próprio não é nenhum ato egoísta; ao contrário, é um ato de amor para com as pessoas que precisam de você ou, simplesmente, das que querem estar próximas de quem elas gostam...

...em tempo, as crianças também sofrem de transtornos de ansiedade!

 

Mauricio Lambiasi

Graduado em Administração e Psicologia Clínica

Pós-graduado em Biologia

Mestrado em Recursos Humanos

Doutorando em Ciências Empresariais e Sociais

Formando em Psicanálise Clínica

                   

                   

                   

Fontes:

American Psychiatric Association. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5). Porto Alegre|: Artmed, 2014.

Organização Mundial de Saúde, Organização Panamericana de Saúde. Cassificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10). Ansiedade. São Paulo: Edusp, 1997.

World Health Organization (2017). Global Health Estimates. Disponível em https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/254610/WHO-MSD-MER-2017.2-eng.pdf?sequence=1

Comentários

  1. Excelente reflexão sobre um problema que afeta cada vez mais pessoas, principalmente no momento que estamos vivendo. Não é fácil lidar com a ansiedade e reconhecer que precisa de ajuda é o primeiro e muito importante passo.

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  2. Triste, mas oportuna reflexão de hoje. Parabéns

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  3. Bela reflexão.
    A ansiedade bloqueia a percepção da própria capacidade. É muito importante procurar ajuda.

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  4. Perfeita descrição da ansiedade e excelente orientação.

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  5. Ansiedade já era o mal do século passado e como vc bem destacou no seu primoroso texto, difícil será encontrar alguém livre deste transtorno que assola a humanidade. Parabéns!

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