Transumanismo e Sindemia

 

Transumanismo e Sindemia

“Estamos condenados à civilização. Ou progredimos ou desaparecemos.”

                                   Euclides da Cunha

 

                      Sim, ultrapassaremos o limite biológico e, graças à ciência e tecnologia, a imortalidade é o destino humano...

                    Para quê? Superamos a Primeira Guerra Mundial e enfrentamos a Grande Gripe que, de 1918 a 1920, ceifou a vida de 17, talvez 50, ou 100 milhões de vidas. Veio, então, a Segunda Guerra e, num mar de destruição, novamente, carregada de cicatrizes, nossa civilização sobreviveu e experimentou momentos de crescimento e alguma bonança.

                    Agora necessitamos refletir sobre o desprezo e uso desmedido que fazemos da natureza (às vezes até parece que não fazemos parte dela). Em realidade, não estamos vivendo uma pandemia, mas sim uma sindemia, termo cunhado pelo médico americano Merrill Singer, pois não se trata apenas da doença causada por um único vírus.

                    Como assim? O isolamento social imposto pelos governos no mundo pode ter algum efeito positivo, mas para a classe alta e média. E os pobres? Como sempre ocorre, os mais necessitados estão sofrendo com abundância, abundância de fome, de desalento, de falta de perspectiva, de metrôs e ônibus lotados...

                    Enquanto ficamos nos digladiando por meio das mídias sociais, a realidade lá fora, longe do home office, desponta de forma cruel. A política barata se sobrepõe às ações mais urgentes, de proteção a quem mais necessita. Mas os ricos e classe média também têm sofrido! O vírus não escolhe classe social! Será?

                    É evidente que muitas vidas têm sido perdidas, inclusive dos mais abastados, e sempre devemos lamentar cada uma delas. Ocorre que o turbilhão de miséria que está se formando é devastador. Os mais pobres terão doenças agravadas por falta de assistência (o que já não é incomum), aliadas à falta de recursos financeiros.

                    Nossa sociedade poderia reduzir a irracionalidade do momento e promover um pacto pelo bem, pelos prejudicados de sempre. Ocorre que o interesse pessoal, pelo poder, pelo assalto à coisa pública continua vivo, muito vivo...

                    Enquanto discutimos quem é o bonzinho e o malvado, a miséria está aí, mas isso não importa, vamos continuar a briga virtual para ver quem é capaz de odiar mais, a direita, a esquerda, o centro, a mídia, os religiosos, os omissos, os donos da verdade...

                    Chegaremos à imortalidade, mas a injustiça social prevalecerá...

                                                                                             Mauricio Lambiasi                  

Comentários

  1. Texto que espelha a sensibilidade, profundida e delicadeza do autor. Parabéns professor Maurício!

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  2. Triste realidade. Parabéns pela abordagem. Bjs

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  3. A triste constatação de nossos dias. Parabéns lucidez

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  4. O texto do nosso ilustre professor, escritor, gestor, consultor e intelectual humanista Maurício Lambiasi é, como já se tornou costumeiro constatar, PRIMOROSO. Fez-me lembrar das discussões acadêmicas em torno da tese transumanista que defende a evolução humana através da progressiva complexificação dos recursos da ciência e da tecnologia. Concordo com tais pressupostos sem renunciar aos princípios do humanismo clássico que, por sua vez, defende a educação e a cultura como sendo os grandes pilares da elevação do espírito humano. O pessimismo da contemporaneidade se amplia na medida em que as injustiças sociais se consolidam por meio da lógica da desumanização (ódio, egoísmo, avareza, intolerância, violência, indiferença e embrutecimento). Se o amor como perfeito vínculo de união tornou-se uma utopia, é urgente e inadiável a rejeição da distopia atual em favor da concretização dos nossos sonhos mais bonitos e solidários.

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    1. Muito obrigado irmão, não apenas pela sua generosidade em relação a mim quanto pelo complemento impecável ao meu texto!

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